ANÁLISE SEMIÓTICO DO VIDEO DA ANA LUISA FLORES

Análise Semiótico do Vídeo da Ana Luisa Flores

 

Vídeo diponível em:

Ana Luísa Flores. A marca na parede.

 

 

Rosely Demercian *

 Ronaldo Auad Moreira*

 Willis Guerra*

 

           

Esta análise, apresentada no contexto da disciplina Semiótica Peirceana, ministrada pela Professora Maria Lucia Santaella Braga, teve como bases duas publicações desta docente: “A eloquência das imagens em vídeos de Educação Ambiental”, roteiro presente em Semiótica Aplicada (2002); Matrizes da Linguagem e Pensamento: sonora, visual, verbal (2001).

Uma breve síntese desta análise, aqui compreendida a partir de uma abordagem mais esquemática:

Signo: o vídeo A marca na parede

Objeto:a duração temporal da leitura, pela artista, de um conto de Virginia Wolf; ou, ainda, a visibilidade de uma temporalidade.

Interpretante: certa angústia provocada pela adesão ou não de uma submissão do intérprete ao tempo do outro.

 

1. Signo (em si mesmo, o fundamento):

 

1.1. Quali-signo

Aspectos de cor: a cor das páginas do livro exposto, uma certa luminosidade.

Pontos de vista: frontal, em câmera fixa.

Enquadramentos: frontal.

Movimentos de câmera: não há (câmera fixa).

Composição visual: a presença do livro aberto seguro pelas mãos de uma mulher (a artista) predomina no enquadramento composicional.

Duração dos planos: um único plano que compreende tempos de exposição de páginas duplas abertas, tempos intercalados pelo virar dessas páginas.

Tom e harmonia do som: silêncio em grande parte da duração do plano, silêncio que, gradativamente, é substituído por sons ásperos de uma rua.

 

1.2. Sin-signo (singularidade do existente)

O vídeo em si disponibilizado pelo vimeo. Essa singularização, os quali-signos nela incorporados, serão introjetados ou não, pois isto dependerá da qualidade do meio que irá presentifica-la.

A duração do vídeo é de aproximadamente 5 minutos. 

 

1.3. Legi-signo

Linguagem videográfica: esta obra está inserida num sistema de linguagem audiovisual, especificamente videográfica, vinculado ao vídeo de arte, modalidade que se caracteriza por rompimentos com a linearidade narrativa, o que faz promover instâncias remáticas, estados em aberto. Vídeos de arte promovem a exclusão de edições previsíveis no estabelecimento de novas temporalidades.

 

2. Objeto (aquilo que o signo indica)

 

2.1. Objeto imediato (está dentro do signo, o modo como o signo representa, indica, sugere aquilo a que ele se refere). Aqui, o objeto imediato é a duração temporal de um ato de leitura.

2.2. Objeto dinâmico (está externo ao signo, o que o signo representa)

O tempo do ato de ler, a morosidade desse ato demandada pela personagem do conto de Virgínia Wolf. No caso do filme Memórias Póstumas de Brás Cubas, o que nele está determinado é um recorte (seu objeto imediato) do texto de Machado de Assis (seu objeto dinâmico). O texto de Machado é, por sua vez, um signo que tem por objeto os costumes da sociedade carioca de fins do Século XIX.

2.2.1 ícone (por similaridade)

Movimentos de câmera: câmera fixa, um único plano, registro direto da duração temporal da leitura empreendida pela artista do conto de Wolf. Este registro direto compreende o passar lento das páginas, os intervalos entre esse passar, a luminosidade do local da ação, local este indeterminado. Tem-se aqui um caso de demora icônica, de algo que teima em não deslizar rapidamente para uma instância indicial.

Composição visual: a presença das páginas abertas do livro ocupa todo o enquadramento composicional. As qualidades dessa presença se assemelham às qualidades atuais próprias dos tons de papéis utilizados para a impressão de textos literários

Montagem: sem montagem

Tom e harmonia do som: silêncio em grande parte da duração deste único plano, silêncio que, gradativamente, é substituído por sons que guardam uma semelhança direta com sons de uma rua.

 

2.2.2. Índice (por conexão de fato)

Nos filmes e vídeos, como na fotografia, o aspecto indicial domina. Trata-se aqui de um registro direto, sem manipulações, de um ato de leitura. Mas a condição icônica deste ato se estabelece pelo fato de pormenores indiciais não se presentificarem. Já os sons que entram gradativamente ao final deste plano são índices concretos de sons de uma rua.

O texto impresso, por sua ilegibilidade, não se dá à leitura, ao contrário de seu título. O desconhecimento, por parte do intérprete deste texto de Wolf, fará com que este título seja um índice em aberto, ou seja, remático.

Em muitos casos, por seu caráter icônico, o título de um texto literário conserva em si uma potência que pode fazer dele algo autônomo, algo para além de sua função como título, como signo indicial. Pinturas, vídeos, composições musicais, coreografias e outras linguagens estéticas podem nascer de reações ao estado em aberto de, por exemplo, “As impurezas do branco”, título de uma reunião poética de Carlos Drummond de Andrade.

 

2.2.3. Símbolo (por hábito)

O ato de ler, a suspensão da realidade que este ato exige.

 

3. Interpretante (efeitos)

3.1. Interpretante imediato (efeito interpretativo potencial está dentro do signo- primeiridade)

Aflição, sujeição, adequação a duração temporal do ato de leitura do outro.

 

3.2. interpretante dinâmico (efeito que o signo produz num intérprete -secundidade)

3.2.1. Emocional (qualidade de sentimento)

Este vídeo, sem dúvida, causa efeitos emocionais no espectador. Eles são ocasionados pela angústia de se submeter ou não ao tempo próprio da leitura do outro

3.2.2. Energético (ação física ou mental)

Da instância anterior, o intérprete deste vídeo pode ser levado a buscar relações entre a duração do ato de ler e o conteúdo deste conto de Wolf.

3.2.3. Lógico (o signo é interpretado através de uma regra interpretativa internalizada no intérprete)

A busca pela localização deste tipo de discurso na produção videográfica da arte brasileira contemporânea, poderá fazer com que o intérprete deste signo se torne, de modo crescente, um intérprete familiarizado com este universo criativo, capaz de gerar discursos sobre ele.

3.3. Interpretante final (resultado interpretativo se levado a seu limite, por isso é inalcançável, até porque o signo cresce em um processo infinito de semiose – terceiridade)

O continuum deste processo interpretativo, ou seja, signos abrindo-se em signos a partir das reações inesgotáveis geradas por este vídeo de Ana Luísa em seus intérpretes.

 

 

 

Referências Bibliográficas

 

ANDRADE, Carlos Drummond de. As impurezas do branco. 10ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2005.

FLORES, Ana Luísa. <Sobre Marcas na Parede.doc>. Rio de Janeiro, ‎ 4‎ de ‎abril‎ de ‎2012. 32,0 KB.

PLAZA, Júlio. Tradução intersemiótica. 1. ed. São Paulo: Perspectiva, 2003.

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1985.

SANTAELLA, Lucia; WINFRIED, Nöth. Imagem, cognição, semiótica, mídia. 2. ed. São Paulo: Iluminuras, 1999, p.73-87.

SANTAELLA, Lúcia. A teoria geral dos signos – como as linguagens significam as coisas. São Paulo: Pioneira, 2000.

SANTAELLA, Lucia. Matrizes da linguagem e pensamento: sonora, visual, verbal. São Paulo: FAPESP/Iluminuras, 2001.

SANTAELLA, Lúcia. Semiótica aplicada.

*** Autores: Roseli Demercian

Possui graduação em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo (2003), graduação em Pedagogia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1987) e mestrado em Educação, Arte e História da  Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie . Curadora de arte do Centro Cultural CasaGaleria. Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

 

Ronaldo Auad Moreira

Professor, Pesquisador e Coordenador de Extensão, Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL – MG, Instituto de Ciências Humanas e Letras – ICHL e Departamento de Ciências Humanas – ICH

Willis Santiago Guerra Filho

Possui graduação em Direito pela Universidade Federal do Ceará (1982), Mestrado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1986) e Doutorado em Ciência do Direito pela Fakultät für Rechtswissenschaft der Universität Bielefeld (1995), devidamente revalidado como equivalente ao título de Doutor do Sistema Educacional Brasileiro, consoante Declaração firmada por autoridade do Sistema Federal de Ensino Superior, em 19 de abril de 1995. Obteve ainda a Livre-Docência em Filosofia do Direito pela Universidade Federal do Ceará (1997), o cargo de professor titular de Filosofia da Universidade Estadual do Ceará (1998) e o Pós-Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2003), onde também obteve o Doutorado em Filosofia (2011). Atualmente é professor titular da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), professor permanente no Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP) e professor colaborador no Programa de Mestrado em Direito da Universidade Cândido Mendes (UCAM), no Rio de Janeiro, RJ, bem como do Curso de Graduação em Direito da Escola Paulista de Direito.Tem experiência em Direito e Filosofia, sendo maior a experiência na área de Teoria do Direito, com ênfase em Direito Público, atuando principalmente nos seguintes temas: direitos humanos e fundamentais, processo constitucional, história e filosofia do direito.

 

 

 

 

 

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