Catálogo Digital da Casagaleria

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ROSA DOS VENTOS / texto curatorial

ROSA DOS VENTOS

Rosa dos Ventos, dentre outros vários significados, sugere o encontro de uma direção, um caminho a seguir, a própria orientação geográfica.

Vivemos a época da alteridade. É intuitivo que se impõem mudanças radicais no comportamento do homem, com o rompimento de fronteiras, o exercício tolerância religiosa, combate a todas as formas de preconceito e a compreensão e repressão às diversas manifestações de violência de gênero. Ou seja, a difusão de uma cultura de valorização do outro numa relação baseada no diálogo e valorização das diferenças, que são qualidades aptas a gerar multiplicação de ideias.

Na arte contemporânea estamos caminhando também para esta alteridade, daí a metáfora que se buscou na Rosa dos Ventos. Ela foi, na época de sua invenção (séc. XIV), fundamental para orientar os navegadores permitindo-lhes superar horizontes e descobrir novas terras e novas culturas. Assim como eles, a arte nos possibilita também conhecer outras terras, outras culturas, outras percepções de mundo.

Usando de uma certa extravagância poderíamos dizer que a exposição Rosa dos Ventos é uma noção de rizoma, pois não tem um centro e nem limites definidos, constituindo-se de nódulos semi-independentes, mas capazes de crescer e se expandir de forma autônoma.

No campo da arte/educação e da filosofia, experiência rizomática diz respeito à construção de um conhecimento e da experiência colaborativa, indene a modelos e princípios previamente estabelecidos. É exatamente esta a filosofia da presente exposição.

O espectador é ativo ao produzir a leitura da obra, absorvendo-a pela diferença de seus afetos, sua memória, seu tempo, seus conceitos, transcendendo no olhar as bordas dos quadros. Ele faz parte do mundo externo à pintura.

Os trabalhos de arte contemporânea são, de uma maneira geral, os vazios e as brechas que permitem ao corpo afetivo do espectador entrar na obra e reelaborar o sentido da arte renovada na direção do outro, num latente estado de espera. A obra é obra por desdobrar-se, por manifestar-se de outro modo a cada oportunidade em que é apreciada, de forma a potencializar e catalisar a própria transformação social.

Sejam bem-vindos à Rosa dos Ventos!

Loly Demercian – curadora de arte

Rosa dos Ventos

convite 3

Rosa dos ventos

Com lançamento super especiais para brindar o final do ano, a casagaleria Loly Demercian convida para celebrar 10 anos de compromisso com a arte contemporânea. E para isso acontecer, realizaremos a exposição Rosa dos Ventos, teremos artistas convidados e o acervo exposto. Será uma apresentação bem lúdica e cheio de novidades.

Só para esquentar o lançamento, leia o que significarosa_dos_ventos_by_wansart-d3h0rji Rosa dos Ventos:

Rosa dos Ventos simboliza a luz sorte, podendo significar também a necessidade de mudanças, de encontrar uma direçãoum caminho a seguir. A Rosa dos Ventos mostra a direção dos quatro sentidos fundamentais de orientação geográfica. O símbolo da Rosa dos Ventos representa uma volta completa do horizonte, com seus pontos cardeais: norte, sul, leste e oeste;pontos colaterais: nordeste, noroeste, sudeste e sudoeste; e pontos subcolaterais: nor-nordeste, lés-nordeste, lés-sudeste, su-sudeste, su-sudoeste, oés-sudoeste, oés-noroeste e nor-noroeste.

Exposição da artista Janaina Barros no Mackenzie

10286776_531832070253754_7337230643557721809_oNovos trabalhos da artista Janaína Barros no Mackenzie. Vale a pena confeir!!

Do dia 14 de novembro a 05 de dezembro

de segunda a sexta: 9.00 as 20 h

e aos sábados das 10.00 as 17.00h

Local: Rua Maria Antonia, 307 prédio 1- Centro Histórico e Cultural do Mackenzie.

Exposição: Ronaldo Auad

convite RONALDO AUAD (1)

MINAS / LIBANO: NÁGILA E OUTRAS PRESENÇAS

A mistura dos universos de duas culturas, a mineira e a árabe, é o fio condutor da mostra individual do artista Ronaldo Auad, que estreará em São Paulo em 8 de novembro (com abertura para convidados dia 7), na Casa Galeria Loly Demercian. O objeto desta exposição – a mistura dos universos mineiro e árabe – também se encontra desdobrado na exposição individual que o artista realiza atualmente no Instituto Moreira Salles de Poços de Caldas, Minas Gerais.

“Minas-Líbano: Nágila e outras presenças” permeia a memória do território de origem do artista – o interior de Minas -, que compreende elementos da arquitetura civil e religiosa, seus exteriores e interiores e aspectos da cultura árabe, relacionados à sua ascendência materna – sons, músicas, cheiros, tecidos, texturas e fotografias de álbuns de família.

Nágila é o nome da tia avó de Auad, falecida nos anos 1930, que esteve presente nas criações do artista. “Convivi com a memória dela, com as imagens. E ela tem sido sempre representada no meu trabalho a partir de um objeto, de um desenho, ou seja, ela faz parte do meu imaginário que abriga também a memória da casa de libaneses cheia de santos.”

Em relação ao que o público pode esperar da mostra, o artista afirma que “é uma obra composta mais de metonímias, de detalhes do que basicamente de um discurso visual próximo de uma narrativa fechada, algo que também não é a função da obra de arte”, ressalta Auad. “É uma obra que talvez pegue o intérprete pelo detalhe, pelo tecido, pela materialidade e outros elementos desse universo.”

A exposição “Minas-Líbano: Nágila e outras presenças” é dedicada a Lucia Santaella, professora, pesquisadora e principal representante da Teoria Geral dos Signos de Charles Sanders Peirce no Brasil.

Além de artista visual, Ronaldo Auad é professor e pesquisador do Instituto de Ciências Humanas e Letras da Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG, onde leciona Semiótica Peirceana e Artes: Fundamentos e Metodologias.

O artista tem obras incluídas nos seguintes bancos de dados, acervos e coleções: Programa Rumos Visuais 1999-2000 e 2001-2002 – Banco de Dados do Instituto Itaú Cultural Virtual, São Paulo, www.itaucultural.org.br; Museu de Arte Moderna de Resende (RJ); Coleção Eloá Bessa, Rio de Janeiro; Centro Cultural Cândido Mendes, Rio de Janeiro; Coleção Nicolette Lacerda Soares, São Paulo; Coleção Eduíno Orione, São Paulo; Coleção Lucia Vilaseca, Rio de Janeiro; Coleção João Bosco Millen, Barra Mansa; Coleção Claude Matchouline de Barros, São Paulo.

A exposição “Minas-Líbano: Nágila e outras presenças” ficará em cartaz de 8 de novembro a 5 de dezembro, com entrada franca.

Serviço:

Exposição “Minas-Líbano: Nágila e outras presenças”

Abertura: dia 7 de novembro, às 20h

Visitação: de 8 de novembro a 5 de dezembro de 2013, de terça a sexta-feira, das 11h às 20h e sábado das 11h às 15h

Local: Casa Galeria Loly Demercian – Av. Doutor Cardoso de Melo, 758/térreo – Vila Olímpia,

São Paulo – SP

Entrada franca

Mais informações: acesse www.casagaleria.com.br

Tel.: (11) 3841-9620

Nelo Pimentel : Refúgios

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Texto critico: Exposição Refúgios

NELO PIMENTEL nasceu em 1948, na cidade de São Paulo, mas atualmente reside em San Isidro, província de Bueno Aires. Fez cursos de ilustração na Escola Panamericana de Arte, fotografia no Instituto IADE e artes plásticas na FAAP. Participou de ateliês com Baravelli, Fajardo, Resende, dentre outros. Expôs na Espanha, Argentina e no Brasil.

O artista tem paixão por barcos à vela, tanto que escolheu dentre várias cidades, expor em Ilhabela. Refugiou-se na Argentina, em Bueno Aires, mas sua alma continuou no Brasil, nos vilarejos daquela bela ilha no Litoral Norte de São Paulo, onde buscou inspiração no Sol, nas montanhas, no verde abundante, nos diversos tons de azul, bege, vermelho, mas principalmente nos barcos à vela ancorados, nos iates, nos barcos pesqueiros, nos barcos-moradia, barcos-passeio, barcos-vida.

Através dos barcos, NELO sinaliza sua paixão pela paisagem bucólica, sempre vazia de pessoas. Pode-se até fazer um paralelo com as obras dos pintores da transição da arte moderna, do pós 1ª Guerra Mundial, do retorno de estilos para a pintura naturalista, mas sem perder as cores conquistadas pelo fauvismo e cubismo, do pré-guerra.

A Escola de Paris, como foi rotulada, trouxe um estilo informal, com uma abordagem intuitiva e sensual, baseada em sentimentos, honestidade, franqueza e inocência.

No Brasil, essa tendência se manifestou na década de 30, com a arte naturalista/realista, do grupo Santa Helena e da família artística Paulista, em particular, com a linhagem novecentista de caráter neocezanniano.

NELO nos mostra essas tendências artísticas em seus trabalhos. As pinturas “COLONIA DEL SACRAMENTO”, “ILHABELA; PICO DO BAEPI”, RIO LUJÁN, RIO DA PRATA são alguns dos trabalhos que traduzem o pensamento do artista em contínuo processo, com as sutilezas das formas, às vezes arredondadas, às vezes geométricas, mas com o espírito das cores predominantemente primárias e secundárias.

Com essa visão, NELO PIMENTEL apresentará na CASAGALERIA LOLY DEMERCIAN, no período de 1ª a 31 de outubro de 2014, a exposição REFÚGIOS, presenteando-nos com seu olhar as sutilezas da vida dos barqueiros; um modo peculiar de ver a natureza, as coisas belas da vida simples, tais como uma brisa batendo no rosto, uma gota de chuva nas árvores, o respirar sentindo cheiro de terra, de água, o cantar dos pássaros e o som da natureza.

Ele nos faz refletir, por meio do seu trabalho, como é bom viver sem pressa, buscando, de vez em quando, um verdadeiro refúgio de paz.

Como disse Mário de Andrade, escrevendo para Adami, um artista Santa Helenista: […] às vezes a arte tem dessas: cria obras balões, que, soltas na vida, não carecem mais da mão que fez para brilhar e peneirar no céu” (Chiarelli, Tadeu: Arte Internacional Brasileira: Lemos editorial, São Paulo: 2002. p.81).

Loly Demercian

Exposição Gianou Viana

IMG_4205TEXTO CRITICO:

EM BUSCA DA TERRA DO ANTES

Gianou Viana

Seu percurso poético deflagra suas memórias de menino, vindo do nordeste, isto é, uma paisagem seca e de casas velhas, feitas de pau a pique, cuja técnica de entrelaçamento de madeiras com vigas verticais fixadas no solo e vigas horizontais, geralmente de bambus, amarradas entre si no cipó.

Se verificarmos atentamente em seu trabalho, em suas Xilogravuras feitas com tiras de papel, longas, verticais, ele representa suas memórias. As estruturas verticais e horizontais, que são as matrizes de uma peça única, funcionam como módulos retorcidos, dando a estrutura dos galhos das árvores secas e os retorcidos das vigas das casas do sertão do nordeste, proporcionando uma diversidade enorme de configurações, que variam de sentido e intensidade através das cores vermelha e preta.

O vazio em relação às áreas impressas, faz-nos entrar em suas tramas retorcidas, na trama de um fenômeno extremamente sensível, que pode descortinar pensamentos inimagináveis.

Como sua pesquisa teve continuidade, Gianou, em seus pensamentos, se perguntou; “O que eu retive desse passado que me faz perceber o presente? O conteúdo percebido por Gianou, a intencionalidade que conecta o futuro e o passado, ancorando em nosso ambiente (Merleau-Ponty, 1994[1]), fez com que o artista temporalizasse uma síntese ou uma unidade de seus pensamentos, dando uma nova forma em sua percepção dos trabalhos feitos anteriormente, como um dualismo, sujeito/objeto, sua experiência atual de estar presente no mundo, sua experiência cognitiva com um corpo fenomênico.

Gianou deu vida aos seus esboços, aos seus pensamentos, nas funções estruturais da representação, construindo casas em maquetes, como se mapeasse vários processos cognitivos de formas que até então estavam abstratas nos entrelaçamentos das casas de pau-a-pique, buscando a terra do antes, viabilizando a materialidade.

Loly Demercian[2]

 

[1] Merleau-Ponty, M.: Fenomenologia da Percepção. Trad. Carlos Alberto de Moura. São Paulo: Martins Fontes, 1994

 

[2]Graduação em Pedagogia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1987) Graduação em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo (2003), especialização no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo( MAC/USP) 2004 e mestrado em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2010). Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela Pontífice Universidade Católica de São Paulo, é curadora do Centro Cultural CasaGaleria e Artes. Tem experiência na área de arte/educação, História da arte e curadoria, atuando principalmente nos seguintes temas: arte contemporânea, novas midias e filosofia contemporânea.

 

Reabertura da CasaGaleria

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Diálogos Possíveis: O Tempo e a Duração na vídeo-instalação

Por: Roseli C. M. R. Demercian

RESUMO

Na busca de novos meios técnicos na arte e no engajamento estético cultural, com uma linguagem plástica contemporânea, a vídeo-instalação manifesta um veículo de registro midiático de transmissão de uma realidade vivida. A existência de outros meios transmissores do pensamento artístico na sociedade contemporânea, como, por exemplo, as novas mídias, nas quais se evidencia uma gama complexa de referências de culturas partilhadas, descortina-se uma inovadora e peculiar visão de mundo. Atualmente não é possível conceber que arte sobreviva por ela mesma, sem gerar reflexos e se relacionar com o meio social.  Não há como imaginar que a produção artística possa estar dissociada da evolução sócio-cultural de um povo e de uma nação; não se pode conceber a arte sem um projeto de formação fundamental do próprio cidadão, atenta à diversidade de signos que compõem a intrincada pragmática da comunicação humana.                      

Palavras-chave: Vídeo-instalação. Bérgson. Tempo. Imagem. Duração.

[1]. Graduação em Pedagogia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1987) Graduação em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo (2003), especialização no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo( MAC/USP) 2004 e mestrado em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2010). Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela Pontífice Universidade Católica de São Paulo, é curadora do Centro Cultural CasaGaleria e Artes. Tem experiência na área de arte/educação, História da arte e curadoria, atuando principalmente nos seguintes temas: arte contemporânea, novas midias e filosofia contemporânea.

            Num exercício prognose-póstuma de memória, percebe-se a evolução das tecnologias eletrônicas e digitais, que foram introduzidas há muito tempo nas artes e,  consequentemente, em nosso cotidiano. Constata-se a existência de diversos meios transmissores do pensamento artístico na sociedade contemporânea, como, por exemplo, as mídias, nas quais se evidencia uma gama complexa de referências de culturas partilhadas e uma original visão de mundo.

Atualmente não é possível conceber que arte sobreviva por ela mesma, sem gerar reflexos e se relacionar com o meio social.  Não há como imaginar que a produção artística dissociada da evolução sócio-cultural de um povo e de uma nação; não se pode conceber a arte sem um projeto de formação fundamental do próprio cidadão, atenta à diversidade de signos que compõem a intrincada pragmática da comunicação humana.

Susan Sontag, em seu livro On Phothography, ao abordar esse tema, estabelece que:

[…] na arte contemporânea a realidade das mídias, assim como antes a realidade da natureza, também incita o artista a reflexão de um mundo presente de signos e aparência. A arte moderna começou a questionar a natureza como superfície da experiência sensível. A arte contemporânea prossegue essa analise com interrogação das mídias técnicas que produzem uma realidade de informação própria entre nosso olhar e o mundo (BELTING. Ano. p. 243).

Nesse sentido, a pesquisa em arte é realizada hoje como uma discussão mais reflexiva, isto é, a forma pela qual essas linguagens podem traduzir nossa realidade. Tal reflexão é possível porque a imagem feita por mídias segue a mesma estrutura da linguagem verbal. Na vídeo-arte, essa estrutura não existe, seu conteúdo é próprio e com uma estética de  linguagem não-verbal.

No caso das imagens, geralmente há um arquivo, uma memória técnica, um conceito de tempo, que o artista utiliza sem roteiros, sem estrutura específica, diferentemente da televisão e da internet.

Ele reinventa essa experiência, traduzindo através das mídias, novas experiências. O artista quebra barreiras temporais e espaciais e “brinca” com os meios tecnológicos num contexto crítico. Brinca, porque na internet e nas mídias eletrônicas em geral a informação é veloz, o consumo é oco e a leitura vertical, pois, horas depois, não nos recordamos de nada que vimos ou lemos; ou seja, é uma leitura cega, praticamente sem consciência. Trata-se de um vazio de matéria ou de um vazio de consciência (cf., nesse sentido: BERGSON, 2006. p. 247).

É nessa ilusão que temos de consciência que a vídeo-instalação cria e recria, leva-nos a refletir sobre o que vemos e sobre o nosso tempo, a nossa consciência das coisas vividas.

Hans Belting, no texto sobre arte multimídia, diz que essa representação de arte (vídeo-instalação) confronta a velocidade das mídias, com a lentidão do olhar; a interpretação aberta toma o lugar da comunicação ou informação fechadas; as perguntas pacientes, o lugar de respostas impacientes.

Como dizia Bergson:

O que se percebe, é a presença de uma coisa ou de outra, jamais ausência do que quer que seja. O que verificamos em nós são ainda fenômenos que se produzem, e não evidentemente, fenômenos que não se produzem; é a presença do objeto, jamais ausência. (1979. p. 246).

Dentro dessa mesma ótica, os artistas plásticos Mauricio Dias e Walter Riedweg desenvolveram projetos tendo por objeto a questão da imigração. O imigrante, assinalam, é aquele que se desloca não só no espaço geográfico, mas no espaço de tempo, restaura a complexidade da vida e adensa o grau de percepção das pessoas em relação à sua realidade[1].

[1]  A condição de imigrante permeia não apenas as escolhas de vida de Maurício Dias e Walter Riedweg, mas principalmente suas posições artísticas e políticas. Entre os anos 1980 e 1990, Maurício Dias viveu como imigrante na Europa. Foi o tempo em que, desacreditado do sistema da arte como um lugar possível para a expressão poética, deu um giro na posição que ocupava como artista plástico, trocando uma produção em pintura e desenho por ações então estrangeiras ao campo da arte. Do encontro com Walter Riedweg, atuante nas esferas do teatro, da música e da performance, surge uma prática coletiva e híbrida, apoiada sobre um projeto a uma vez estético, cultural e político. Um trabalho que, como aponta a crítica e curadora francesa Catherine David, no texto Do próximo e do distante: algumas notas sobre o trabalho de Dias & Riedweg, “nos convida a repensar a relação entre estética e política e a questionarmos politicamente as práticas artísticas”. De fato, a cada trabalho realizado, dispositivos são renovados no sentido de buscar uma nova percepção da realidade, algo parecido ao frescor do primeiro olhar sobre o mundo.

Dias e Riedweg escolheram a vídeo-instalação para documentar, registrar e transpor de maneira criativa, suas liberdades de expressão e movimentação, onde exploram distâncias temporais e espaciais.[1]. Esses autores apresentaram, em 2007, durante a Documenta 12 em Kassel[2] na Alemanha, e, em 2009, no Instituto Tomie Othake em São Paulo, a vídeo-instalação Funk Staden. Nela colocaram à luz a questão do tempo e do espaço. Como se trata de uma vídeo-instalação é uma arte espacial, ou seja: só existe enquanto está montada. Isso significa que:

A imagem é um estado presente, e só pode participar do passado através da lembrança da qual ela saiu […]. Se a consciência não é mais que característica do presente, ou seja, do atualmente vivido, ou seja, enfim, do que age, então o que não age poderá deixar de pertencer a consciência sem deixar necessariamente de existir de algum modo. (BERGSON, 2006. p.164).

Dias e Riedweg, na referida vídeo-instalação, abordam num instante o fluxo do tempo porque Bergson acredita que, dado que tudo está mudando o tempo todo, o fluxo do tempo é fundamental a toda realidade; a alteridade; a história, que se faz necessária para a própria continuidade do tempo, a lentidão do olhar, que nos faz parar e refletir, e, principalmente, o fenômeno, que se produz no espaço ou pelo menos no tempo, e que ela implica ainda a evocação de uma imagem, impedindo de desaparecer sem ser logo substituído (BERGSON, 1979, p. 249).

A imagem abaixo é um tríptico de vídeo-instação. Retrata, inicialmente, a modernidade do Século XVI, por meio de uma gravura (no centro), na qual se vê Hans Staden[1], observando indígenas brasileiros praticando antropofagia, e, paralelamente a essa gravura, dois vídeos de um morro do Rio de Janeiro.

Fotografia do Tríptico

[1]   Hans Staden foi um aventureiro mercenário alemão. Por duas vezes Staden passou pela América Portuguesa  no início do século XVI , onde teve oportunidade de participar de combates na Capitania de Pernambuco e na Capitania de São Vincente, contra corsários franceses  e seus aliados indígenas. De volta à Europa, redigiu um relato sobre as peripécias em suas viagens e aventuras no Novo Mundo, uma das primeiras descrições para o grande público acerca dos costumes dos indígenas sul-americanos. O livro é intitulado “Warhaftige Historia und Beschreibung eyner Landtschafft der wilden, nacketen, grimmigen Menschfresser Leuthen in der Newenwelt America gelegen” e foi publicado em Marburgo, Alemanha, por Andre Colben em 1557. Chama-se comumente “Duas viagens ao Brasil”. Tal livro conheceu sucessivas edições, constituindo-se num sucesso editorial devido às suas ilustrações de animais e plantas, além de descrições de rituais antropofágicos e costumes exóticos.

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Figura 2: Hans Staden (ao centro e com barba), destaque da gravura do tríptico

Nas laterais do tríptico, há de um lado, mulheres dançando Funk, e, de outro, homens comendo churrasco e dançando com essas mesmas mulheres (figura 3), fazendo uma analogia com antropofagia e, ao mesmo tempo, sugerindo a violência do morro e suas complexas relações sociais.

Imagem 3

Ao retratar o  universo do Baile Funk no Rio de Janeiro, Dias e Riedweg revisam a questão da percepção sobre a diversidade cultural no curso do tempo.

A história se repete, ela é substituída com outros fenômenos, apreendida no inconsciente, no domínio da consciência [1]. Todo real é atual. O espaço nos fornece assim, de uma só vez, o esquema de nosso futuro próximo. A criatividade na arte transcende, portanto, o indivíduo, e Bergson atribui esse valor à própria intuição, porque ela está no espaço do tempo, naquilo que é virtual. [2]

É uma forma de representação do conhecimento, já que é anterior ao conceito, que penetra no objeto de modo imediato, quer dizer, entre arte e vida, passado no presente, nesse fluxo de continuidade, e impedir a banalização da existência, um vai-e-vem contínuo entre natureza e o espírito (BERGSON, 1979: 210).

[1]   No inconsciente, segundo Bérgson, as coisas já existem, de algum modo, e uma vez que, por hipótese, sua consciência não as apreende, como poderiam existir em si a não ser no estado inconsciente?  (BERGSON, 2006.  p.167).

[2]  O passado é virtual (inconsciente) ele coexiste consigo como presente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERGSON, Henri. Matéria e Memória (tradução Paulo Neves). São Paulo: Martins Fontes, 2006.

  1. A Evolução Criadora. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.

COUCHOT, Edmund. A Tecnologia na Arte: da Fotografia à Realidade Virtual. Porto Alegre: UFRGS, 2003.

HANS, Belting. O Fim da Historia da Arte (tradução de Rodnei Nascimento). São Paulo: Cosac Naif, 2006.

MARSHALL, Macluhan. Os Meios de Comunicação como Extensões do Homem. São Paulo: Cultrix, 1974.

MITCHELL, W.J.T. (org). The Language of Images. Chicago, 1974.

PILLAR, Analice Dutra (org). A Educação do Olhar. Porto Alegre: Mediação, 2001.

STRAUSS, Levi C. Olhar, Escutar, Ler. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.